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Transformação do cargo de DATILOSCOPISTA para PERITO PAPILOSCOPISTA, ambos da Polícia Civil de Pernambuco, é alvo de julgamento no STF.

Entenda o caso:

Em 2010, foi editada, em Pernambuco, a Lei Complementar Estadual nº 186/2010 que, dentre outras coisas, alterou a nomenclatura do cargo de datiloscopista que passou a ser denominado perito papiloscopista. Esse cargo que teve sua nomenclatura alterada pertence à estrutura da Polícia Civil do Estado de Pernambuco.

Lei Complementar nº 156/2010.
Art. 3º. O cargo descrito no inciso VIII do artigo 7º da Lei Complementar nº 137, de 2008, fica redenominado, a partir da data de publicação da presente Lei Complementar, para Perito Papiloscopista, mantidas as suas atuais simbologias de níveis, e respectivas prerrogativas institucionais e sínteses de atribuições.

Texto anterior:
Lei Complementar nº 137/2008.
Art. 7º. (...)
VIII - Dactiloscopista Policial, símbolo de nível "QPC";

Texto atual:
Lei Complementar nº 137/2008.
Art. 7º. (...)
VIII - Perito Papiloscopista;

O cargo continuou o mesmo, apenas mudou de nome, passando de datiloscopista para perito papiloscopista. Pelo que se percebe, não houve transformação de um cargo em outro. Houve apenas a alteração da denominação de um cargo, sem qualquer outra mudança. Mudanças até poderiam ter ocorrido, desde que dentro dos parâmetros constitucionais já balizados pelo STF em seguidas decisões sobre o tema ‘transformação de cargos públicos’. A possibilidade de transformação de cargos públicos é, portanto, uma realidade incontroversa.

Como se pode facilmente perceber, a legislação questionada tratou somente de simples alteração de nomenclatura com menção expressa à manutenção de todas as demais características do cargo.

O cargo de perito papiloscopista (antes denominado datiloscopista) é um dos cargos cujo ocupante deve ser reconhecido como servidor policial. Servidor policial é a expressão utilizada pela Constituição Federal (CF, art. 144, §9º) para designar o servidor público que ocupe um cargo público de natureza policial, ou seja, que desempenhe em suas atribuições a atividade fim dos órgãos de segurança pública. À inteligência do dispositivo constitucional citado, são servidores policiais os integrantes dos órgãos de segurança pública. São todos, dessa forma, autoridades policiais.

Em 2014, a Procuradoria Geral da República (PGR) protocolou, junto ao STF, ação direta de inconstitucionalidade em face da acima citada legislação estadual pernambucana que alterou a denominação dos cargos de datiloscopista para perito papiloscopista. Trata-se da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5182.

Para a PGR, a lei pernambucana é inconstitucional por haver usurpação da competência da União para legislar sobre normas gerais de organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis estaduais, conforme prevê o artigo 24, inciso XVI, da Constituição Federal. De acordo com a PGR, a denominação de cargos de peritos oficiais e a fixação de suas atribuições interferem no direito processual penal, cuja competência legislativa também é da União, de acordo com o artigo 22, inciso I, da Constituição. Afirma, também, que a Lei Federal 12.030/2009 fixa expressamente que os cargos de peritos de natureza criminal são os de peritos criminais, peritos médico-legistas e peritos odontolegistas e exige de todos eles formação superior específica.

Figuram como amicus curiae as seguintes entidades de classe:

1. Associação Brasileira de Criminalística – ABC;

2. Associação de Polícia Científica do Estado de Pernambuco – APOC/PE;

3. Sindicato Nacional dos Peritos Criminais Federais – APCF;

4. Federação Nacional dos Policiais Federais – FENAPEF; e,

5. Federação Nacional dos Profissionais dm Papiloscopia e Identificação – FENAPPI.

Como já houve a liberação da ação direta de inconstitucionalidade para julgamento, segundo jurisprudência do STF, não é mais possível que outras entidades de classe ingressem na lide na qualidade de amicus curiae. A intervenção do amicus curiae consiste na pluralização do debate constitucional, com vistas a municiar a Suprema Corte dos elementos informativos necessários ou mesmo trazer novos argumentos para o deslinde da controvérsia. Assim, a habilitação Supremo Tribunal Federal de entidades representativas se legitima sempre que restar efetivamente demonstrado o nexo de pertinência entre as finalidades institucionais da entidade e o objeto da ação direta.

O relator dessa ADI é o ministro Luiz Fux, que votou pela improcedência do pedido, ou seja, pela manutenção da alteração da nomenclatura.

Em voto pela improcedência da ação, o ministro Luiz Fux observou que a Constituição Federal, em seu artigo 24, inciso XVI, confere à União e aos estados competência concorrente para legislar sobre organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis, cabendo à primeira editar normas gerais, estabelecendo diretrizes, e aos estados-membros da federação editar normas suplementares.

Para o relator, as normas pernambucanas apenas complementam a lei federal, sem incorrer em contradição ou usurpar sua competência. Em seu entendimento, a norma geral não esgotou normas de organização das polícias civis nem foi exaustiva no tocante a especificar quem são peritos criminais, e também não veda a equiparação, em lei específica, entre peritos e datiloscopista. O ministro destacou que a função do perito é auxiliar o magistrado em matérias que demandem seu conhecimento especializado, e, nesse sentido, é possível aventar um rol bem mais amplo de agentes que atuam como peritos criminais além dos que constam da legislação federal.

Fux ressalta que a mera modificação de atribuições e níveis de escolaridade exigidos para o cargo não viola o princípio do concurso público nem representa provimento derivado de cargo público. De acordo com o ministro, as aptidões e competências exigidas para o exercício dos dois cargos são semelhantes e os datiloscopistas ingressaram na carreira por meio de concurso público. Em relação à escolaridade, ele explica que lei do Estado de Pernambuco já exigia diploma de curso superior para os datiloscopistas policiais.

CONCLUSÃO

A Confederação Brasileira dos Policiais Civis (COBRAPOL) e o Sindicado dos Policiais Civis do Estado de Pernambuco (SINPOL PE) infelizmente sequer requereram o ingresso em tão importante e simbólica lide. As ausências da COBRAPOL e do SINPOL PE podem não passar despercebidas.

O resultado desse julgamento não importa apenas aos servidores policiais ocupantes dos cargos de perito papiloscopista da Polícia Civil de Pernambuco cujo cargo pode voltar a ser denominado como anteriormente. Importa a todos os servidores policiais do Brasil, em especial os ‘não-delegados’ e ‘não-oficiais’. Esse julgamento terá reflexos na luta inicial pela fusão (transformação) dos cargos da base das Polícias Civis e na consequente definição de uma carreira única para os servidores policiais que integram os órgãos de segurança pública brasileiros para os quais as regras para transformação dos cargos públicos serão fundamentais.

Importa ainda à sociedade que, mesmo sem saber, é refém da desorganização administrativa dos órgãos de segurança pública criada por leis que aprisionam o sistema aos interesses de castas. Estagnado, esse sistema que não permite que a maioria de seus integrantes (servidores policiais) cresçam profissionalmente, podendo alçar cargos de gestão em suas respectivas instituições, dando novas perspectivas para a ação policial.

A insegurança pública generalizada em nosso país tem servido de combustível para diversas reflexões acerca das causas dos constantes aumentos dos índices de violência e de criminalidade. Uma das conclusões que se chega é de que algo deve ser mudado na atual arquitetura interna dos órgãos de segurança pública. A mudança da nomenclatura de um cargo demonstra, sem sombra de dúvida, ser o primeiro passo para o processo de modernização pelo qual todo o sistema de segurança pública deve passar. Está em curso um processo silencioso e natural de modernização da atuação policial brasileira. Não há uma articulação central, vez que infelizmente, a União ainda não assumiu seu papel natural de coordenador desse debate, os Estados (e os Municípios também) têm procurado novas formas de organização de seus órgãos de segurança.

A intenção é buscar alternativas que, a curto e médio prazos, melhorarem a qualidade da atividade policial. Esse é o espírito do dispositivo legal que ao simplesmente alterar a nomenclatura (denominação) do cargo de datiloscopista para perito papiloscopista imprimiu fundamental autoestima aos servidores policiais atingidos com a mudança.

Os antigos datiloscopistas não querem ser tratados por “doutor” ou por “excelência”, querem apenas serem socialmente reconhecidos pelo que efetivamente são: peritos naquilo que fazem.

Aracaju, 06 de março de 2019.

ANTONIO MORAES, servidor policial civil
escrivão da Polícia Civil do Estado de Sergipe
coordenador do coletivo 'Amigos do SINPOL Sergipe'
ex-presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Sergipe


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